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7ª e 8ª hora após a Reforma Trabalhista: entenda esse direito e como calcular

No Brasil, quando pensamos em horas extras, o mais comum é considerarmos “extra” apenas aquelas realizadas após 8 horas de trabalho, não acha? 

Digamos que Jhonatan, vendedor de uma loja no centro, possui uma jornada das 9h às 18h, com 1h de intervalo. Podemos dizer que ele apenas receberá horas extras quando ultrapassar o horário das 18h, concorda? 

De fato, não está errado. Entretanto, determinadas profissões possuem regras diferentes definidas por lei, e esse é o caso da classe bancária. 

Veja o caso de Ana, antiga escriturária de banco. Ana trabalhava 6 horas por dia até meados de 2016 pois estava inserida na regra específica da classe bancária que consta na Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Veja só:

Como ela exerceu com excelência suas tarefas e demonstrou aptidão comercial, rapidamente chegou ao cargo de Gerente de Contas, em 2017.  De lá para cá, passou a trabalhar 8 horas por dia, das 8:30 às 17:30, tendo 1 hora de descanso. 

Assim como ela, Alberto, que era caixa e trabalhava 6 horas por dia, foi promovido a supervisor administrativo, e passou a ter a mesma jornada de Ana: 8:30 às 17:30. 

A modificação de jornada de 6 para 8 horas ocorreu pois o mesmo artigo 224, em seu parágrafo segundo, prevê uma exceção quando estão preenchidos 2 requisitos

Confira:

Um dos requisitos (grifado em azul) refere-se a um critério objetivo:

Ana está recebendo uma gratificação de, no mínimo, 1/3 em relação ao salário base? 

Vejamos:

  

Sim, ela está. E, assim como ela, Alberto e outros milhares de bancários recebem a gratificação de função com valores até maiores do que o estipulado na norma. Deste modo, o primeiro requisito para Ana realizar uma jornada de 8 horas está cumprido. 

Já o segundo requisito (grifado em vermelho) aborda um critério subjetivo, ou seja, precisa ser analisado com base na realidade do sujeito. Neste caso, a pergunta a ser feita é: 

Ana possui um cargo de confiança? Analisemos: 

Apesar de deter um cargo de gerência, Ana não detém efetivos poderes de mando nem possui autonomia em suas decisões. 

No organograma da agência, consta que ela está acima de Paulo, um agente comercial de 6 horas. Porém, quando Paulo chega atrasado, ela não pode adverti-lo e nem mesmo penalizá-lo por suas faltas frequentes ao serviço, o que acaba dificultando o atingimento de suas metas. 

Se Ana quiser demitir Paulo por falta de comprometimento e contratar outra pessoa mais engajada para seu posto, também não pode. 

Assim, apenas por essa razão, já poderíamos dizer que Ana não tem um cargo de confiança. 

O próprio Tribunal Superior do Trabalho já se posicionou sobre o tema. Veja:

Imagem retirada do link: https://www.tst.jus.br/cargo-de-confianca, em 10/12/2022. 

Mas, além disso, Ana tem outras limitações. Para executar suas atividades comerciais, Ana se vê restrita ao sistema do banco. Ou seja, quando um cliente a procura para obter um empréstimo, ela apenas pode ofertar o que já está pré-aprovado pelo sistema. Dito de outro modo, Ana executa a venda com suas habilidades técnicas, mas não negocia com autonomia. Inclusive, por vezes, Ana constata que as propostas que seu cliente encontra no internet banking são mais atraentes que as suas. 

Desse modo, as atividades rotineiras de Ana, Gerente de Contas, não são consideradas típicas de um cargo de confiança, já que estão ligadas a questões operacionais e técnicas. 

Logo, não estando preenchidos os 2 requisitos necessários para que Ana realize uma jornada de 8 horas, ela deve realizar apenas 6. 

Como Ana consegue modificar sua situação e receber o pagamento pelas 2 horas extras que trabalhou desde 2017? 

Para verificar que seu cargo não é de confiança, Ana terá que ingressar com uma ação trabalhista, realizar uma audiência e convidar colegas de trabalho para contarem ao juiz quais são suas atividades no banco. Por isso, para ter sucesso, é indicado que Ana contrate um advogado especializado em causas trabalhistas bancárias

Verificado pelo juiz que Ana trabalhou desde 2017 sem um verdadeiro cargo de confiança e realizando uma jornada de 8 horas, o banco será condenado a pagar-lhe a sétima e oitava horas como extras de todo esse período. Inclusive, se Ana continuar no banco realizando uma jornada de 8 horas, as futuras sétima e oitava também deverão ser pagas. 

Veja uma decisão similar ao caso de Ana:

  

Como se faz o cálculo para saber o valor da sétima e oitava hora? 

Abaixo, segue mais uma vez o contracheque de Ana, para relembrar:

 

Um cálculo estimativo pode ser realizado utilizando a seguinte fórmula:

Aplicação da fórmula no exemplo + explicação passo a passo:

 

1º A soma do salário base (R$3.595,43) + gratificação de função (3.954,97) = R$ 7.550,40; 

2º Dividimos o total por 180 = R$ 41,95 (esse é o valor da hora normal); 

3º Como estamos buscando o valor da hora extra, precisamos acrescer 50% ao valor da hora normal = R$ 62,92; 

4º Este valor, multiplicamos por 2, referente à sétima e oitava horas = R$125,84; 

5º Agora, multiplicamos por 30 (dias do mês), e obtemos o valor devido mensal referente às horas extras = R$ 3.775,20 (sem reflexos).  

Quer saber o valor da sua 7ª e 8ª? Faça o download da nossa planilha aqui. 

O que aconteceu após a reforma trabalhista de 2017 e a convenção coletiva dos bancários de 2018? 

Ana, em conversa com Alberto durante seu almoço, soube que, apesar de tudo isso, algumas coisas haviam sido modificadas com a reforma trabalhista de 2017 e que, no ano seguinte, a convenção coletiva dos bancários também sofreu alterações. 

Na dúvida do que era verdade ou não, resolveu visitar o Dr. Fernando, seu advogado de confiança especialista no assunto, e perguntou a respeito destes importantes eventos. 

Para seu espanto, Fernando confirmou algumas de suas suspeitas. 

Disse que a reforma trabalhista (11/11/2017), de fato, alterou muitos artigos da CLT e também incluiu novos, mas informou que o artigo 224 não havia sofrido alterações. 

Fernando chamou a atenção de Ana para um artigo específico, o 611-A, que inovou com o que ficou conhecido como “o negociado sobre o legislado”:

 

 

Mencionou que, com a nova norma em vigor, na Convenção Coletiva de Trabalho do ano seguinte, em 2018, após negociação realizada entre FENABAN e CONTRAF, foi definido o seguinte:

 

 

Ana questionou por qual motivo essa alteração havia sido realizada, já que parecia prejudicar os bancários. 

Segundo Fernando, o que pretendem os bancos com essa nova regra é definir que os valores pagos a título de gratificação de função já estejam remunerando as sétima e oitava horas. 

Neste caso, se Ana ganhar seu pedido de sétima e oitava horas em juízo, todo o valor referente a essas horas extras será reduzo com os valores recebidos da parcela gratificação de função. 

Para facilitar a visualização do impacto dessa nova regra, Fernando mostrou como ficaria o novo cálculo:

Ou seja, o valor mensal que ela tem a receber pela sétima e oitava continua sendo R$ 3.775,20. Porém, agora, ela precisa diminuir desse valor o que recebe de gratificação de função (R$ 3.954,97).

 

 

 

Logo, o cálculo final é:

Ana ficou paralisada com a notícia. Era pior do que ela imaginava! 

“Doutor, agora eu vou ter que pagar ao banco?”, indagou ela. 

Fernando continuou sua explicação informando que a convenção coletiva prevê uma outra norma, definindo que o saldo não poderá ser negativo:

   

O pedido da sétima e oitava horas vai acabar? 

Ana estava confusa, achando que o pedido de sétima e oitava horas havia praticamente acabado. Porém, pediu mais explicações, pois pelo pouco que havia estudado, entendia que o valor da gratificação de função que recebia remunerava a maior responsabilidade de seu cargo, e não as horas extraordinárias. Como pode a convenção dizer o oposto? 

Fernando, sabendo que o assunto é realmente complexo, buscou elucidar. 

Com paciência, explicou que, apesar da convenção coletiva buscar o fim do direito de Ana, ela estava correta no raciocínio, que as parcelas não podem se confundir. 

Disse que, desde 2018, muitos tribunais e juízes têm afastado a aplicação da 11ª cláusula por entenderem que, além da interpretação de Ana, a norma está em desacordo com a Lei Maior, a Constituição Federal. Consequentemente, estes juízes têm mantido o pagamento das sétima e oitava horas.  

Para conhecimento de Ana, Fernando informou que as fundamentações utilizadas pelos magistrados são muitas: 

Alguns entendem que a norma da Convenção Coletiva busca limitar a interpretação do Poder Judiciário, contrariando o princípio do livre convencimento motivado dos magistrados.  

Outros, a consideram inválida pelo fato de não visar a melhoria da condição social dos trabalhadores, afrontando o artigo 7º, caput, XXVI:

 

Além disso, Ana ficou sabendo que na própria Reforma Trabalhista foram incluídos artigos que limitam o poder do “negociado sobre o legislado”. Inclusive, soube que alguns desses limites estão no próprio artigo 611 da CLT, como abaixo é possível verificar:

  

Ou seja, para que haja redução do direito ao recebimento a horas extras, apenas se houver estabilidade no emprego, o que não ocorreu com Ana. 

Por fim, Fernando apresentou a súmula 109 do TST, celebrando o direito da bancária:

Naquele dia, Ana concluiu que, se ela desejasse ingressar com uma ação buscando o pagamento das sétima e oitava horas trabalhadas, ainda seria possível sim. Para corroborar seu entendimento, Fernando apresentou decisões sobre o assunto e, dentre as muitas, a que segue abaixo:

 

 

Quem adere a PDV tem direito a sétima e oitava horas? 

Porém, como Ana ainda não estava decidida a ingressar com o pedido, foi para casa refletir. Ciente de que deveria se proteger de uma demissão, começou a guardar os documentos necessários para uma possível ação futura. 

Um mês depois da consulta com Fernando, foi pega de surpresa com um comunicado do banco, via e-mail, informando que seria aberto um Programa de Desligamento Voluntário (PDV) nos próximos dias. 

Tão logo finalizou a leitura, ligou para Fernando e questionou: 

“Doutor, se eu aderir ao PDV, ainda poderei ingressar com ação solicitando o pagamento da sétima e oitava hora?” 

Fernando explicou que não poderia dar essa resposta sem antes ler o regulamento do Programa. Era necessário analisar se alguma cláusula tratava sobre a quitação desse direito. Ainda, disse que, mesmo que existisse essa previsão, seria necessário confirmar se o Sindicato dos Bancários havia aprovado. Caso contrário, seria possível.   

Desse modo, Ana aguardou alguns dias até que o banco liberasse o regulamento. Tão logo obteve o documento, enviou para análise do Dr. Fernando. No dia seguinte, Fernando informou a Ana que não havia encontrado nenhuma cláusula que retirasse seu direito ao recebimento das horas extras caso ingressasse com uma ação, e que ela poderia sim ingressar com o pedido mesmo que aceitasse o PDV.   

Todavia, alertou que se não aproveitasse aquele PDV para ingressar com a ação, poderia haver outro Programa de Desligamento futuro prevendo a quitação do direito aprovado pelo Sindicato. Neste caso, não poderia ser feito nada. Para finalizar, enviou para Ana, via e-mail, a seguinte decisão do TST:

  

Imagem retirada do link:  https://www.tst.jus.br/-/pdv-sem-norma-coletiva-n%C3%A3o-gera-quita%C3%A7%C3%A3o-ampla-e-irrestrita-de-contrato-de-banc%C3%A1rio , em 23/02/2023 

Resumindo: 

O que é o pedido “sétima e oitava horas”? 

Conforme verificado acima, é o pedido pelo qual o bancário que realiza jornada de 8 horas (gerente de relacionamento, analista, supervisor, etc.) comprova em juízo que não é detentor de cargo de confiança e, consequentemente, consegue o pagamento das horas extras a partir da 6ª. Sendo assim, tem remuneradas a sétima e oitava horas trabalhadas. 

Todo bancário tem direito a sétima e oitava horas? 

Não. Apenas os bancários que não possuem autonomia e poderes de mando, mesmo que detentores de cargos com nomenclaturas que indiquem isso (gerente, supervisor, chefe de serviços), terão direito ao recebimento da sétima e oitava horas. 

Com a reforma trabalhista, o direito as sétima e oitava horas acabou?? 

Não, pois o artigo 224 da CLT não sofreu nenhuma alteração e, mesmo com nova norma definindo a prevalência do negociado sobre o legislado, a Convenção Coletiva dos Bancários é inconstitucional nesse ponto. 

Com a convenção coletiva dos bancários (CCT) de 2018, o direito as sétima e oitava horas acabou? 

Não, pois muitos juízes e magistrados têm compreendido que a previsão da CCT afronta direitos constitucionais e súmulas do TST. 

Se aceitar um PDV ou PDE, é possível ingressar com pedido da sétima e oitava horas? 

Depende. Se não houver participação do Sindicato na negociação das cláusulas, é possível. 

Porém, se houver previsão de quitação e o Sindicato aprovar, não haverá possibilidade. 

Como faço para saber o valor do meu pedido de sétima e oitava horas? Como realizo o cálculo? 

Baixe nossa planilha, disponível aqui

Cumpre informar que a planilha concede apenas uma estimativa, podendo o valor da ação neste ponto ser majorado ou diminuído ao ser efetivado por um contador. 

E você? Se identificou com a história de Ana ou tem dúvidas se as mesmas regras cabem no seu caso? Nossa equipe terá o maior prazer em auxiliar na solução dos seus questionamentos. Para isso, nos chame pelo Whatsapp clicando no botão que aparece canto inferior direito da sua tela. Ou, se preferir, nos envie um e-mail que retornaremos o mais breve possível com a resposta.

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