Todo processo (judicial) tem um começo, um meio e um fim. O início é com o ajuizamento de uma reclamatória trabalhista buscando direitos sonegados, maculados ou não reconhecidos pelo Empregador; o desenvolvimento se dá pelo contraditório entre Empregado x Empregador através de seus Advogados, realização de audiências, decisões judiciais; terminando com o trânsito em julgado de uma decisão judicial que reconheça os direitos pedidos com o exercício do direito de ação.
Como sabem, essa é apenas a primeira fase processual, a chamada fase de conhecimento (dos direitos), porque depois, inicia-se a segunda fase processual, a de execução, onde os direitos reconhecidos serão transformados em créditos e/ou obrigações de fazer/pagar pelo Empregador.
Em razão da costumeira demora no trâmite processual - 1o Grau (Juiz do Trabalho), 2o Grau (TRT) e 3o Grau (TST) -, é possível tentar antecipar o fim do processo através de um acordo, ou seja, uma conciliação entre as Partes.
Logicamente, se tratando de uma conciliação, ambas as Partes abrem mão de alguma faculdade processual, direito e/ou obrigação. É bom que se diga que não há obrigatoriedade alguma em conciliar, sendo uma manifestação de vontade das Partes, obtida através de um entendimento a partir de concessões mútuas a respeito de valores e/ou obrigações, podendo ser mediadas por um Julgador ou diretamente entre os Advogados em nome de seus Clientes.
Exemplificativamente, imaginemos o ajuizamento de uma reclamatória trabalhista em que se busque apenas um único direito: horas extras, e os consequentes reflexos. Como se nota, tendo apenas uma discussão, é um processo comumente conhecido como "tudo ou nada", "8 ou 80". Vamos dizer que o valor da causa é de R$ 100.000,00. Se esse Reclamante fosse Bancário, nossa Perita Contadora anteciparia o demonstrativo considerando a aplicação da Cláusula 11a da Convenção Coletiva dos Bancários, o que reduziria - neste exemplo hipotético - para R$ 30.000,00 caso a cláusula negociada venha a ser aplicada futuramente.
Cada Empresa possui sua política interna quanto a negociação de acordos. Tem aquelas que não aceitam conciliar, tem aqueles que possuem políticas ínfimas, tem aqueles que jogam pra frente, tem aquelas com políticas razoáveis e aquelas com políticas sazonais. Com boas políticas, é raro! Fato é que não existe um padrão, nem mesmo dentro da própria Empresa, pois depende dos direitos que estão sendo requeridos, da documentação correlata, da perspectiva probatória, da predição da Jurisprudência, do caixa, da época do ano, da análise de risco daquela reclamatória trabalhista, da vontade do tomador de decisão.
Então, o que define um "bom acordo"? Sem considerar um rol taxativo, internamente, consideramos 6 variáveis:
1) o valor da causa versus o valor proposto;
2) a fase processual: se eventual proposta é antes da contestação, é na audiência inicial, é antes da instrução, é após a audiência de instrução, é após a Sentença, é antes do julgamento pelo TRT, é após o julgamento pelo TRT, se o processo está no TST, se já está na fase de execução;
3) o ônus da prova (e por isso somos verdadeiramente exigentes - para não dizer "chatos" - com a necessidade de comprometimento do Reclamante com suas Testemunhas);
4) a jurimetria (que, resumidamente, é o estudo das decisões em casos anteriores e análogos proferidos por aquele Juízo, considerando o respectivo Juiz do Trabalho, o Desembargador Relator, a Turma do TRT, o Ministro Relator e a Turma do TST);
5) o que consideramos o "bom senso", ou o dito sendo de "justiça", daquele Magistrado, advindo do comportamento numa determinada audiência; e,
6) a necessidade do Reclamante, pois a autonomia da vontade do Cliente é o que deve ser respeitada (mesmo contrariando nossa indicação, às vezes, rs).
Voltando ao exemplo, imaginemos que na Audiência Inicial a Empresa (Reclamada, na Justiça do Trabalho) faça a proposta de R$ 40.000,00. Esse valor é interessante? Depende, justamente, da análise das 6 variáveis elencadas acima.
Imaginemos que na Audiência de Instrução, a Reclamada faça a proposta de R$ 50.000,00 e o Reclamante decline. Feita a prova oral (oitiva das Partes e das Testemunhas), seja renovada tal proposta e mesmo assim decline. Sobrevém a Sentença de improcedência, ou seja, o processo passa a valer R$ 0,00. Obviamente, a proposta que antes existia, não existirá mais, por conta da análise de risco do processo. Na prática, vamos recorrer ao TRT com um trabalho técnico muito bem fundamentado, e ainda torcer (ou até orar) para que seja distribuído para uma Turma e um Relator em que a Jurimetria aponte decisões favoráveis para o reconhecimento de tal direito.
Agora, imaginemos a mesma fase processual e idêntico valor indicado no parágrafo anterior, mas sobrevém a Sentença de procedência, ou seja, o processo está valendo R$ 100.000,00. A Reclamada faz uma proposta de R$ 60.000,00. Esse valor é interessante? Depende, agora, da Jurimetria da respectiva Turma do TRT, e correlato Desembargador que venha a ser sorteado como Relator. Então, pensemos que o recurso da Empresa foi distribuído para uma Turma em que a Jurimetria é negativa para o direito do Reclamante, a proposta passa a se tornar (muito) interessante, não é mesmo?
Agora, se considerarmos um Bancário e a Sentença fosse de procedência, mas o Juízo tivesse aplicado a Cláusula 11a da CCT, o processo estaria valendo R$ 30.000,00. Se o recurso do Banco (neste caso) fosse distribuído para uma Turma em que a Jurimetria é negativa ao direito perseguido pelo Reclamante, uma proposta de R$ 25.000,00 pode(ria) ser interessante.
Não há como nós conhecermos o futuro, mas estar atento aos sinais é extremamente importante (e por vezes, rentável). Pois são os sinais que compõem aquilo que chamamos de Jurimetria. Assim, acreditamos no método que busca predizer, estatisticamente, como determinado Juízo julga casos análogos. Não há certeza absoluta do julgamento (futuro), mas apenas um grau de probabilidade considerando os julgados passados. Aliás, nesse sentido, Benjamin Franklin tem uma frase por deveras assertiva: "na vida só há 2 certezas absolutas: a morte e os impostos".
Nesta toada, lembro também de uma frase constantemente utilizada pelo Dr. Gelson, lembrando um saudoso Jurista: "mais vale um mau acordo do que uma boa demanda" . E aqui, tanto o fator tempo, quanto o fator paz, cambia o interesse das Partes, enquanto o processo segue sua marcha rumo à incerteza.
Assim, compartilharei um caso interessante e recente para demonstrar, na prática, como toda essa análise de variáveis são levadas em consideração aqui no Escritório.
Temos uma Cliente que trabalhou num certo Banco por 10 anos e foi demitida, sem justa causa, quando exercia o cargo denominado "Gerente de Contas" (gerência média). Os direitos que buscamos foram: equiparação salarial; 7a e 8a horas como extras; intervalo da mulher (art. 384/CLT); PLR proporcional; e, dano moral; sendo o valor da causa estimado em R$ 397.841,62.
Logo na Audiência Inicial - começo do processo, portanto - recebemos uma proposta de acordo de R$ 80.000,00. Declinamos. No particular, além desta Audiência, tiveram outras 3 Audiências de Instrução antes da Sentença, sendo que na última delas, o Juízo indeferiu a oitiva de 2 Testemunhas indicadas pela Empresa:
Assim, com o encerramento de instrução processual, sobreveio a Sentença:
Vitória parcial, onde conquistamos a 7a e 8a horas como extras, o intervalo da mulher, a PLR proporcional e uma indenização por dano moral.
O Banco não apresentou nenhuma proposta para tentar conciliar neste momento.
Nós recorremos por conta da equiparação, e o Banco logicamente recorreu para tentar a reabertura da instrução, a fim de conseguir ouvir as 2 Testemunhas impedidas pelo Juízo. O recurso foi distribuído para uma Turma no respectivo TRT, composta por 3 Desembargadores Federais do Trabalho.
A partir da Jurimetria, buscamos o Jurídico da Empresa para tentar um acordo nesta fase, porém, a resposta recebida foi: "Informo que, por ora, não temos proposta de acordo aprovada a apresentar".
Na sessão de julgamento (presencial) de tais recursos pelo TRT, o Desembargador Relator assim tinha decidido:
Ou seja, ele cassava o direito da 7a e 8a como extras. Contudo, o Desembargador Revisor, pediu vistas, retirando o processo para analisar com calma. Nova sessão de julgamento (presencial) designada, e por unanimidade de votos, o TRT deu provimento ao recurso do Banco para reabrir a instrução processual a fim de realizar a oitiva daquelas 2 Testemunhas, para posterior novo julgamento pelo Juízo de 1o Grau. E sim, para os interessados e antenados de plantão, o Relator voltou atrás em seu entendimento e acompanhou a divergência quanto à reabertura da instrução, de modo que, o que ele cassava (7a e 8a horas como extras) e limitava (intervalo da mulher), ficou prejudicado.
Realizada a nova Audiência de Instrução com a finalidade específica de ouvir as 2 Testemunhas indicadas pela Empresa, sobreveio a mesma Sentença anteriormente prolatada pelo Juízo de 1o Grau. Novamente, tanto nós (pela equiparação), quanto o Banco recorreram, e por um critério de competência no mundo do Direito chamado de "prevenção", os recursos foram distribuídos para a mesma Turma realizar o 2o julgamento no TRT, tendo o mesmo Desembargador anterior como Relator.
Então, o que isso nos diz?
Que o Relator vai cassar a 7a e 8a horas como extras - que é o pedido de maior repercussão financeira nesta reclamatória - e limitar a concessão do intervalo da mulher. Os outros 2 Desembargadores, o Revisor e o Vogal, não se manifestaram se acompanhariam ou abririam divergência quanto a tais pedidos na sessão de julgamento anterior, but , pela Jurimetria, a tendência daquela Turma é negativa ao direito pleiteado pela Reclamante quanto às horas extras para gerentes médios.
Eis que então, o Banco formalizou uma proposta de R$ 120.000,00.
A Perita Contadora readequa a liquidação, e o processo passa a valer R$ 324.462,24.
Logo se inicia uma negociação onde a pretensão autoral era de R$ 275.000,00. A Empresa majorou para R$ 135.000,00 e depois, o Jurídico cogitou aumentar para R$ 200.000,00 pendendo de aprovação interna. Mas, a Reclamante desejava R$ 250.000,00. Tentamos, e como tentamos! Até que o Jurídico fez parecer a fim de o Banco aprovar a majoração da proposta para R$ 227.000,00.
Como não era o que a Reclamante queria, demorou uns dias para responder se aceitava, ou não, tal proposta máxima, a fim de o Jurídico buscar a aprovação interna junto à Diretoria do Banco.
Ela responde que sim e imediatamente informamos ao Jurídico, que solicitou a validação interna.
A Turma do TRT pautou o julgamento dos recursos para dali 2 semanas, em sessão virtual.
O Jurídico aguardava a aprovação (e nós - Reclamante e Escritório - também!).
Nos inscrevemos para fazer sustentação oral. Então, o processo foi retirado da pauta virtual para inclusão em pauta presencial futura.
Aconteceu que a nova data de julgamento foi designada para dali 1 semana, em sessão presencial.
O Jurídico seguia aguardando a validação interna (e nós, praticamente sem saber para quem mais rezar!).
1 dia antes do julgamento, peticionamos para a retirada do processo da pauta presencial, vez que as Partes estavam em tratativas de conciliação.
O Relator acata o nosso pedido, suspendendo o julgamento por 15 dias para a tentativa de conciliação.
No 13o dia do prazo - finalmente!, com todas as glórias! - saiu a aprovação interna, de modo que assinamos a Minuta e juntamos nos autos para a devida homologação.
Designada a Audiência de Conciliação , o acordo foi devidamente homologado pelo TRT:
Ufa!
Como diria Galvão Bueno: "haja coração, amigo".
Isso prova que a emoção não está somente no futebol, num daqueles jogos decisivos, mata-mata , fora de casa, em que o time do coração está empatando com uma grande equipe gringa, 1x1, e nos acréscimos do 2o tempo o VAR chama o árbitro no ponto para que este observe e analise um lance de eventual impedimento antes de validar o gol que levaria à derrota e, consequentemente, à desclassificação.
Por vezes o empate fora de casa tem cara de vitória, pois pode garantir uma classificação ou apenas somar +1 ponto na tabela, mas fato é que depende de eni variáveis, objetivas e subjetivas, as quais não dependem, apenas, da nossa vontade, de jogadores e torcedores, por mais que estejamos com garra e de pé até o apito final.
Querer um acordo, nem sempre é poder alcançá-lo.
E quando ele se torna necessário, possível e (ainda) interessante, chegando a arrancar um genuíno sentimento de gratidão, como aconteceu (de maneira inesperada, diga-se de passagem ) neste caso,
concretizamos, sorridentes e confiantes, nossa missão institucional: ajudar nossos Clientes a conquistar o máximo, correndo o menor risco.