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Está escolhido.

No Espaço Vital do último mês, mostramos que tem Julgadores que escolhem ao invés de decidir. E tal diferenciação, será o objetivo do artigo de hoje. 

Todos somos habituados a fazer escolhas, e as fazemos todos os dias. Escolhemos a hora de deitar, se vamos correr na praia, se vamos encontrar a família ou os amigos neste próximo fim de semana, se optamos por uma alimentação saudável, se escolhemos uma roupa preta hoje e uma roupa branca amanhã, e com tantas escolhas, temos um (falso) senso de liberdade. 

Mas quem aqui nunca se sentiu "paralisado" com tantas escolhas? E por isso, acabou não tomando atitude alguma? Como escolher um único prato analisando o cardápio de um restaurante com inúmeras opções que parecem (todas) saborosas? Quem nunca ficou em dúvida ao entrar numa adega para escolher uma garrafa de vinho dentre tantos terroir? Ou numa loja de departamentos com promoção de 50% em todas as peças de todas as coleções, em que a fila dos provadores lembram quando era dia de pagamento do benefício do INSS numa Agência de Caixa Econômica Federal? 

Escolhas fazem parte do nosso cotidiano, e muitas delas seguem nossa rotina ligada no piloto automático. 

decidir, pertence a outro mundo, "um pouco" mais complexo. Se nos darmos conta de que o produto do ato de decidir é a decisão, temos uma cisão, a qual precisa ser adotada: de-CISÃO. 

Ou seja, decidir é definir o norte, e saber que para chegar lá, precisa-se trilhar um rumo. É uma postura que indica um caminho, percorrendo etapas e vivenciando o que acontece a cada sinal, cada curva, cada conversão, até cruzar a linha de chegada. Para daí decidir de novo para outro(s) rumo(s) e assim cronologicamente. 

Cumprida essa rápida - e superficial - digressão psicológica, passemos ao mundo jurídico, onde qualquer leigo identifica e compreende que também neste universo algumas pessoas (investidas na função jurisdicional, seja um Juiz ou uma Juíza) escolhem ao invés de decidir. 

I. Vejam esse trecho de uma Sentença prolatada por um Juízo de Joinville/SC, numa reclamatória trabalhista promovida em face do Banco do Brasil:

Quer dizer que se apresentar "muito bem vestidos" e com um "estilo que demonstra elegância, personalidade, segurança", garante que um Gerente de Banco seja detentor de um dito cargo de confiança? Perceba que o Julgador inclusive ressalta que independe que esse Gerente exerça "função de chefia", pois intui que pela aparência ele "goza de confiança" para externalizar a imagem da respectiva instituição financeira (!). 

Seria cômico se não fosse trágico. 

Justamente alicerçado nisso, o resultado foi a improcedência em 1º Grau para a desconstituição do cargo de confiança. 

Em que pese não ser recente (mas de 2018), esse mesmo Julgador continua pela região, sentenciando inúmeras reclamatórias trabalhistas. Claro que hoje em dia ele não coloca mais nas Sentenças tal "fundamentação" para julgar improcedente o direito de reconhecer a 7ª e 8ª horas como extra para Gerentes de Banco, em virtude de reformas perante o TRT-12 - inclusive essa ora indicada - mas será que ele se despiu de tal compreensão? 

II. Analisem esse trecho de uma Sentença recentemente prolatada por um Juízo de Curitiba/PR, numa reclamatória trabalhista promovida em face do Itaú Unibanco:

 

Existe um problema aqui. 

O Juízo reconhece que na instrução processual (audiência), até o Preposto e as Testemunhas convidadas pelo Banco (!), reforçam a (nossa) tese do Reclamante, para ter direito ao recebimento da 7ª e 8ª horas como extra, porém, como o Banco cumpre o requisito objetivo de pagar a gratificação não inferior a 1/3 do salário base, isso basta(ria) para julgar improcedente o pedido (!). 

Logicamente, nosso escritório recorreu ao TRT-9 aqui, e com toda força argumentativa e probatória, lutaremos para reformar tal Sentença. 

III. E por fim, vejam esse trecho de uma Sentença também recentemente prolatada, por um Juízo do Rio de Janeiro/RJ, numa reclamatória trabalhista promovida em face da empresa Verisure Smart Alarms:

Ou seja, em que pese "eu" [Juízo] não poder desconsiderar o depoimento da Testemunha convidada pelo Reclamante, como o mesmo Escritório (GELSON FERRAREZE SOLUÇÕES JURÍDICAS) possui diversos processos em face desta mesma empresa, com os mesmos pedidos, julgo improcedente a demanda tocante ao recebimento das horas extras e prejuízo na remuneração variável (!). 

Claro que também recorreremos, aqui ao TRT-1, inclusive para demonstrar a recorrente e sistemática violação de direitos trabalhistas por parte de tal empresa, chamando atenção do Ministério Público do Trabalho para tal fato em futura sustentação oral quando da sessão de julgamento. 

E o que esses 3 casos demonstram? 

Que tais Julgadores optaram por escolher, em detrimento do decidir

Nas palavras do doutrinador Lenio Streck (Procurador de Justiça aposentado MP/RS, Professor e Advogado), "há uma diferença entre escolher, que está no plano da razão prática, e decisão, que está no plano da responsabilidade política e da intersubjetividade", ressaltando que existe uma "necessidade de separar a pessoa do juiz no seu cotidiano do juiz autoridade, que possui responsabilidade política". 

Bingo, é isso: o que a pessoa do Julgador pensa sobre tal assunto pode não ser, necessariamente - pois depende de provas a produzir -, o mesmo que o Julgador tenha que decidir nos processos sob sua jurisdição. 

Para além das teorias e princípios aplicáveis, e correntes sobre a Teoria da Decisão Judicial - que são temas jurídicos - o que queremos chamar a atenção aqui é justamente o problema que enfrentamos quanto a isso, também nos processos perante o Poder Judiciário, assim como em nossas vidas pessoais. 

A Sentença proferida pelo Juízo de 1º Grau, ou o Acórdão proferido pelos Tribunais, devem consonância com o ato de decidir, ou seja, através de nossas peças processuais e argumentações em audiências, despachos e sustentações orais, o que buscamos é uma forma de controlar o exercício da jurisdição. 

A interpretação jurisdicional é o substrato da compreensão do direito (in)aplicável àquele caso concreto. E todo juiz deve fundamentar sua decisão, sob pena de nulidade (nos termos do art. 93, IX da Constituição Federal), a partir da coerência e integridade do sistema jurídico considerando o caso concreto, ou seja, levando em consideração os fatos narrados na petição inicial daquela reclamatória trabalhista, a contestação da empresa Reclamada nesta reclamatória trabalhista, as provas documentais, depoimentos pessoais e testemunhais produzidas nessa mesma reclamatória trabalhista. 

O ato de decidir é um caminho, lembram?! 

Como cantou criticamente Chico Buarque na música "Construção", aqui [no nosso Escritório e para nossos Clientes] não deixaremos que aquele que "morreu na contramão atrapalhando o tráfego, [...] morreu na contramão atrapalhando o público, [...] morreu na contramão atrapalhando o sábado", ou ainda - acrescentamos - "morreu na contramão atrapalhando o Juízo", sofra a sanção como se, perseguir seus próprios direitos, impedisse o funcionamento da engrenagem econômica-empresarial. 

Em nosso escritório, cotidianamente, percorremos os caminhos e, ainda que encontremos pedras, altos degraus e pontes de duvidosa segurança, continuamos lutando pela concretização dos direitos sociais trabalhistas a partir da construção em cada processo, engrossando o coro contra a escolha indiferente de alguns. 

Essa é a nossa decisão.

Espaço Vital